Justiça autoriza o uso da pílula anticâncer a morador de Piacatu


Produzida pela USP, substância usada no tratamento contra o câncer divide opiniões

16/01/2016 23:05 - Atualizado em 09/02/2016 19:19 | Por: Otávio Manhani

Otávio Manhani/Jornal Comunicativo

Pílula anticâncer ainda não é considerada como medicamento

O produtor rural e vereador Paulo Cezar Vendrame, 51 anos, morador de Piacatu, que faz tratamento contra um câncer de pulmão com metástase nos ossos desde o ano passado, conseguiu na Justiça Federal de Araçatuba as pílulas de fosfoetanolamina sintética, produzidas pelo Instituto de Química da USP (Universidade de São Paulo), em São Carlos.

O paciente começou a tomar a pílula da fosfo no dia 11 deste mês, sendo duas por dia. A esposa do produtor rural informou ao Comunicativo que, após o marido ter começado a tomar a pílula, ele parou de perder peso e apresentou melhora na disposição física.

“Nos próximos dias ele fará novos exames e, após isso, poderemos verificar como o organismo dele está reagindo à substância. Pedimos a Deus para que os resultados sejam melhores quando compararmos aos exames anteriores e agradecemos todas as pessoas que estão em oração pela recuperação dele”, declarou a esposa de Vendrame.

Na região de Araçatuba, apenas o paciente de Piacatu e um aposentado de 68 anos, de Birigui, conseguiram liminar na justiça concedendo o pedido de antecipação da tutela da pílula, que ainda é uma droga experimental e, portanto, não possui registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

A iniciativa em procurar a Justiça Federal partiu do advogado Edvaldo Almeida, de Clementina. Ele explicou que o motivo foi o TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo) ter cassado, recentemente, todas as liminares em trâmite por falta de registro da substância na Anvisa.

Outro fator que fez com que Almeida procurasse a Justiça Federal foi pelo fato de os desembargadores do TJ-SP terem proibido os juízes de tomarem decisões futuras sobre o mesmo assunto. “Neste caso, a ação foi dirigida contra a União em cumprimento à Constituição Federal. E diante do sofrimento dos pacientes, a Justiça Federal atuou de forma rápida, deferindo as liminares no mesmo dia em que os pedidos foram protocolados”, explicou o advogado.

Na liminar, o juiz colocou que “a ausência de registro na Anvisa não afasta a responsabilidade do Estado e nem o direito de o autor de obter a substância requerida, à medida que a obrigação dos entes públicos de garantir o direito à saúde não se limita ao registro do fármaco, tampouco ao fornecimento exclusivo de medicamentos registrados, sob pena grave afronta às disposições legais constitucionais”.

De acordo com a Anvisa, até o momento nenhum processo de registro foi apresentado para que a fosfoetanolamina possa ser considerada um medicamento. A etapa é fundamental para que a eficácia e segurança do produto possa ser avaliada com base nos critérios científicos aceitos mundialmente. Para obter o registro é preciso apresentar documentos e testes clínicos.

Depoimentos

Para o presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, Evanius Wiermann, não há como utilizar a substância nos pacientes sem as devidas análises de segurança e eficácia. “Não é certo sermos coniventes com uma droga que não tem evidência científica”, disse.

Em depoimento à Agência Brasil, o chefe da Oncologia Clínica da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), Hakaru Tadokoro, também discorda do uso da substância sem que os testes clínicos sejam realizados e considera isso uma irresponsabilidade. “A pessoa que vai tomar essa droga não sabe os efeitos colaterais ou se é tóxica”, avisou.

Já o advogado Edvaldo Almeida, que conseguiu na Justiça as pílulas para o paciente de Piacatu, disse que “entre as pessoas que estão utilizando as pílulas da fosfo, ninguém apresentou efeito colateral e reação adversa relacionada à toxicidade da substância produzida pelo Instituto de Química da USP”.

Almeida também conseguiu na Justiça a pílula para uma paciente de 62 anos, moradora de Campinas, que tem 23 tumores espalhados pelo corpo e outras lesões espalhadas no cérebro. “Em contato com o filho da paciente, ele me informou que a mãe ganhou aproximadamente quatro quilos, voltou a enxergar e já se locomove em casa”, comemora o advogado.